Muitos cristãos verdadeiros têm
rejeitado, seja por desconhecimento, seja pela imediata associação com o
catolicismo romano, os ensinamentos trazidos pela correta observação do tempo
da quaresma. Contudo, esta data celebrada pela Igreja que é, em resumo, o tempo
litúrgico reservado especialmente para refletirmos sobre a conversão, as
doutrinas da Fé, da Graça, além de ser um momento fundamental de preparação
individual e em grupo para o tempo de Páscoa. A quaresma possui raízes muito
mais profundas do que a maioria desses cristãos devotos imaginam.
A palavra ‘quaresma’ tem origem na junção de duas palavras oriundas do Latim, “quadragesima” (Quadragésimo) + dies (dia), fazendo, assim, referência
ao tempo de 40 dias que antecedem a Páscoa. Sua celebração faz parte da
história da Igreja Cristã e de sua tradição, assim como a prática de orar
fechando os olhos. Ela é fundamentalmente um período em que devemos refletir na
Palavra do Senhor e nos Catecismos, pedindo ao Todo-Poderoso que nos prepare
para compreender e viver a celebração da Páscoa em sua integralidade.
Ao que tudo indica, a celebração
da quaresma costumava seguir imediatamente a celebração da Epifania, tal qual a
peregrinação de Jesus pelo deserto, era seguida imediatamente de seu batismo. Entretanto,
logo nos primórdios da Igreja (por volta do século IV d. C.), a celebração da
quaresma foi associada à da Páscoa, visto que é uma ocasião propícia para a
realização de batismos, profissões de fé, e reconciliações daqueles que haviam
sido excluídos da comunhão por faltas graves (isso explica o fato das principais
características da quaresma serem autoexame, arrependimento, estudo da palavra
e preparação para a Páscoa).
Enquanto os candidatos ao Batismo
eram instruídos na Fé Cristã e os penitentes arrependidos preparavam-se por
meio do jejum, da oração e do estudo das Sagradas Escrituras a fim de serem
readmitidos à comunhão, toda a comunidade cristã era convidada a se juntar a
eles no processo de estudo e arrependimento ao longo dos quarenta dias que
antecediam a Páscoa. Durante esse tempo, os fiéis eram lembrados também da
tentação que Nosso senhor Jesus Cristo suportou no deserto.
Visto não ser um sacramento, a
quaresma não é de observação obrigatória, nem está diretamente ordenada nas
Escrituras; no entanto, ela não deve ser rejeitada pelo fato de não ser
diretamente citada na Bíblia.
Observe-se também que, ao
contrário do que possa parecer, a escolha do número exato de quarenta dias não
foi aleatória e arbitrária, mas foi feita com base na importância dada pela
Bíblia ao número quarenta. Algumas passagens que evidenciam muito bem a
relevância do numero em questão nas Escrituras são:
I) por quarenta dias e quarenta
noites o dilúvio durou ( Genesis 7:4-12);
II) por quarenta dias Moisés
permaneceu no monte Sinai, recebendo a Lei de Deus (Ex. 25:1-8);
III) por quarenta anos reinaram
Saul (Atos 12:21), Davi (II Samuel 5:4-5) e Salomão (I Reis 11:42);
IV) por quarenta dias nosso Senhor
Jesus foi tentado no deserto (S. Mateus 4:2);
V) por quarenta dias o Senhor
Instruiu seus discípulos antes da Ascensão (Atos 1:1-3).
A quaresma não deve ser entendida
como algo místico ou dotado de algum poder mágico especial. A observância desse
período tem como único objetivo trazer o cristão ao centro da vida cristã,
enfatizando o estudo da Palavra, a oração, o jejum e a prática da caridade
Cristã (para maiores detalhes sobre a verdadeira Caridade Cristã, consulte o
livro “Charity and its Fruits”
escrito por Jonathan Edwards). Evidentemente, tais virtudes não devem ser
cultivadas apenas durante o tempo da quaresma como se fossem obrigações
legalistas e através das quais se alcançaria o favor Divino. Muito pelo
contrário. A quaresma é o tempo propício para que o Cristão reflita e retome
alguns aspectos da vida Cristã que podem haver sido perdidos ou enfraquecidos ao
decorrer da caminhada de fé em razão da decaída natureza humana.
Assim fica fácil concluir que a
observação da quaresma não se trata de uma prática idólatra, sem fundamento,
carregada de misticismo e dispensável como dizem alguns. Antes de tudo, tal
celebração é um convite ao arrependimento e à retomada de uma vida Cristã
frutífera.