“Dias virão, contudo, em que lhes será
tirado o Noivo;
e, nesse tempo, jejuarão”
S. Marcos, 4.20
Neste ano, pela primeira vez, assumi o
firme propósito de observar o tempo da Quaresma. Não, não sou católico-romano.
Pela graça do bom Deus, sou a quarta geração de presbiterianos da minha
família. Se para você um protestante observando a Quaresma soar um tanto quanto
esquisito, sugiro a leitura deste artigo
(colocar link: http://reformedfaith.blogspot.com.br/2015/02/reflexoes-sobre-quaresma-sob-uma.html) do meu confrade Alla Gallo Antonio. Como eu
dizia, neste ano, pela primeira vez, assumi o firme propósito de observar o
tempo da Quaresma. Tomada a decisão, comuniquei-a à minha esposa, a qual, como
verdadeira “auxiliadora idônea” (Gn 2.18), voluntariamente assumiu o mesmo
propósito que eu.
Nestes quarenta dias escolhi algumas abstinências
dietéticas, bem como a renúncia a alguns confortos e distrações; gastei mais
tempo com as minhas devoções particulares e procurei detectar onde e como eu
poderia melhorar como cristão, marido e pai. Tal qual Jacó que, por amor à
Raquel, laborando em prol do seu sogro, sentiu que os anos passaram-se como
dias (Gn 29.20), assim poderia eu dizer que estes últimos quarenta dias passaram-se
como se fossem algumas horas. Não quero afirmar, com isto, que o jejum tenha
sido fácil; ou que o desejo pelas distrações e confortos voluntariamente
renunciados não tenha sido intenso. Não obstante, esses quarenta dias foram de
tal forma intensos e reveladores, que o seu transcurso se manifestou, pela
assistência do Espírito Santo, graciosamente mais rápido do que o foi na
realidade. O presente texto que o caro leitor tem agora diante dos olhos nasceu
do desejo deste “penitente iniciante” de comunicar, em linhas bastante simples
e práticas, um pouco da sua experiência com a observação da Quaresma.
Observando o tempo da Quaresma eu pude
sentir-me em estreito contato com a tradição cristã. A observância de um
período de jejum e conversão precedendo a celebração da Páscoa data do século
IV da era cristã. Desde então, milhões e milhões de cristãos ao redor do orbe
terrestre, de todas as partes do mundo, das mais diversas escolas e tradições
cristãs reservaram dias específicos para buscarem, de modo especial, a face de
Deus através do jejum, da oração e da leitura das Escrituras. Contemplando
agora já o crepúsculo da estação quaresmal, saio da mesma feliz por sentir em
maior contato com a nossa bimilenar tradição cristã.
Observando o tempo da Quaresma eu pude constatar
a importância de, e a capacidade que o Senhor nos confere, para subjugarmos a
nossa carne. As disciplinas física e espiritual às quais voluntariamente me
submeti nestes quarenta dias me revelaram como o Senhor Jesus Cristo, de fato,
socorre aqueles que são tentados (Hb 2.18); como o Espírito Santo deveras nos
assiste em nossas fraquezas (Rm 8.26). Contemplando agora já o crepúsculo da
estação quaresmal, saio da mesma fortalecido em meu homem interior, consciente
de que realmente não há tentação permitida por Deus que esteja acima das nossas
capacidades (1Co 10.13).
Observando o tempo da Quaresma eu pude
constatar quanto tempo vinha desperdiçando com coisas triviais. O simples
abandono de alguns hábitos, a moderação em algumas práticas, um pequeno sacrifício
no tempo de sono... e eis que meu dia “ganhou” algumas horas. Tempo para os
exercícios devocionais, tempo para reflexão, tempo para a família. A instrução
apostólica para “remir o tempo” (Ef 5.16) ganhou, para mim, sentido e aplicação
todo especiais nestas últimas semanas. Contemplando agora já o crepúsculo da
estação quaresmal, saio da mesma decidido a consagrar melhor o tempo que o
Senhor me tem dado sobre a terra.
Observando o tempo da Quaresma eu pude
tornar-me mais consciente de toda a humilhação à qual voluntariamente se
submeteu o Nosso Senhor Jesus Cristo enquanto esteve entre nós. Nos períodos em
que eu sentia-me mais acossado pelo desejo de transgredir os votos que
voluntariamente assumi, eu recordava o exemplo de Cristo, o qual, durante o seu
ministério terreno, levou toda uma vida de renúncias, abstinências e
sacrifícios. Longe de ser um mero ascetismo irracional e estéril, o período
quaresmal foi para mim as lentes pelas quais pude enxergar quão pueris serão as
minhas queixas por quaisquer dificuldades que eu venha a enfrentar, quão
ínfimas serão todas as limitações com as quais eu venha a me deparar nesta
vida; em comparação com o exemplo de Cristo, que “a si mesmo se esvaziou,
assumindo a forma de servo” (Fp 2.7), quaisquer sofrimentos ou contrariedades
que eu venha a enfrentar são nada, são “menos que nada, como um vácuo”.
Contemplando agora já o crepúsculo da estação quaresmal, saio da mesma decidido
a ter firmemente diante dos meus olhos o exemplo de renúncia e abnegação que
nos deixou Nosso Senhor Jesus Cristo.
Este foi um singelo resumo da experiência
que pude desfrutar ao término desta temporada de quarenta dias. Espero que este
relato e o seu tom um tanto pessoal não sejam recebidos pelo caro leitor como
presunção, pieguice, ou qualquer outra coisa do gênero. Se este texto tiver
servido para despertar o seu interesse pela Quaresma, dar-me-ei por satisfeito
em ter exposto – e me exposto – nestas linhas tão desajeitas, um pouco daquilo
que o Espírito Santo trabalhou no meu coração nas últimas semanas.
Feliz Tempo de Páscoa a todos!
Christus
vincit!